Guimarães Rosa

Consciência Cósmica


Pág -146

Já não preciso de rir.
Os dedos longos do medo
largaram minha fronte.
E as vagas do sofrimento me arrastaram
para o centro do remoinho da grande força,
que agora flui, feroz, dentro e fora de mim...

Já não tenho medo de escalar os cimos
onde o ar limpo e fino pesa para fora,
e nem deixar escorrer a força de dos meus músculos,
e deitar-me na lama, o pensamento opiado...

Deixo que o inevitável dance, ao meu redor,
a dança das espadas de todos os momentos.
e deveria rir , se me retasse o riso,
das tormentas que poupam as furnas da minha alma,
dos desastres que erraram o alvo do meu corpo...

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Luar


Pág-26

De brejo em brejo,
os sapos avisam:
--A lua surgiu!...

No alto da noite as estrelinhas piscam,
puxando fios,
e dançam nos fios
cachos de poetas.

A lua madura
Rola,desprendida,
por entre os musgos
das nuvens brancas...
Quem a colheu,
quem a arrancou
do caule longo
da via-láctea?...

Desliza solta...

Se lhe estenderes
tuas mãos brancas,
tla cairá...

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O dia inteiro, as águas ouviram,
e as matas entederam,
as vozes que o vento vai levando
para oeste, para longe, para alem de Culuene,
onde o sol se apaga , como a fogueira da última taba,
onde os cocares dos buritis pendem imobilizados,
e o rio marulha a canção dos guerreiros
que vão desaparecer...

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